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Welcome to our publication platform! You can browse and search for stories and samples from all our writers. Thanks to our translators, each story is available in Czech, Dutch, Italian, Polish, Portuguese, Romanian, Serbian, Slovene and Spanish. Throughout the years, this platform is becoming a growing archive of European literature by the future generation of literary artists. We're sharing stories beyond barriers.
Outra Cidade
Outra cidade
Amesterdão no limiar do outono era colorida e caprichosa. O sol alternava-se com a chuva, e isso repetia-se uma e outra vez tal como Ave-Marias num rosário. Encontrava-me debaixo da ponte, esperando até que um dos breves aguaceiros parasse. Tinha planeado uma viagem de bicicleta pelos arredores de Amesterdão. Quis ver aqueles famosos pólderes - canais de água que cruzam os prados verdejantes dominados por moinhos de vento que esticam os seus braços, feito uns espantalhos no campo. Era suposto ser a minha primeira viagem na nova cidade. A primeira experiência que de alguma forma i...
Translated from
CZ
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PT
by Stepanka Lichtblau
Written in CZ by Anna Háblová
Esmeralda da depressão
ESMERALDA
Velas, em vez de candeeiros. Baldes, em vez de bidés. Abortos acidentais, legais e com fartura.
Era a Idade Média e dava-se mais um parto caseiro. Feliz, nasceu luz e tratava-se da primeira menina com olhos azuis. A primeira vez, nascidos na terra, por debaixo do céu celeste, oculares tons do que está por cima, e não por baixo. O primeiro milagre da estética, os olhos castanhos e/ou pretos do reino nunca tinham visto nada assim.
A senhora veio à rua. Trazia hortaliças biológicas numa mão, o recém-nascido na outra. Queria chegar à Igreja para mostrar aquilo, talvez o padre soubess...
Written in PT by Luis Brito
Francamente querida, tanto me faz
O Marek faz-me cair na cama e pelo seu rosto passa-se algo que combinado com o seu aperto, me faz perder completamente a orientação, como se a nossa cama fosse uma avalanche em que ele me afundou e eu esquecia onde é em cima e onde é em baixo. Tudo isto dura apenas um segundo, esse aperto e essa sua expressão, no momento seguinte saca-me da avalanche, e ainda que eu permaneça na posição horizontal, já me é perfeitamente claro onde é em cima e onde é em baixo. E só agora atinjo, mas mesmo assim apenas em contornos, agora me apercebo dessa ideia, que dispara pela minha cabeça como se alguém acen...
Translated from
CZ
to
PT
by Stepanka Lichtblau
Written in CZ by Lucie Faulerová
O zumbido
No comboio, na última parte da viagem, tinha visto pela janela pegajosa as bordas do céu. Levantou-se para ver também do outro lado da carruagem e aproximou-se do homem adormecido com a cara escondida atrás do cortinado e com a mão direita firmemente pousada na pequena mala de viagem, que estava no assento ao lado. Sim, da sua janela via-se o mesmo. Um cobertor compacto, azul índigo, num plano paralelo ao campo extenso, cheio de molhos secos. E na sua orla, um azul aberto e claro, como um mar afastado, suspenso entre o céu e a terra.
Por cima da camada índigo, estava sol.
Quando se levantou,...
Translated from
RO
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PT
by Cristina Visan
Written in RO by Lavinia Braniște
A Ilha
Até hoje não sei bem o que estava a fazer nas ilhas. De que estava à procura? Sei só o que deixei para trás. O país que me deu o passaporte. A mulher que me deu a vida. Tantas coisas que podia comprar com dinheiro. O mundo que eu não conseguia e não sabia mudar.
A água do mar estava morna. Ao anoitecer, as ondas resplandeciam repletas de plâncton. Depois de tantos anos de viagem, já não sabia reconhecer bem as docas entre palmares onde normalmente costumava apanhar os sucessivos barcos. Fiquei confusa com os nomes das ilhas, todos começados por palavras como koh e nusa. Fiquei confusa com os...
Translated from
PL
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PT
by Katarzyna Ulma Lechner
Written in PL by Urszula Jabłońska
Moça-Morte
Bloqueio da linha.
O suicídio por estrangulamento é relativamente raro. Segundo a prática habitual, o garrote costuma ser enrolado mais vezes e até pode ser assente em algo macio. Durante o estrangulamento, a irritação do nervo vago e a compressão das artérias carótidas impedem o fluxo de sangue para o cérebro e fecham a circulação respiratória. É que a laringe pode não fechar completamente e por isso morrer assim leva mais tempo do que no caso do enforcamento - a menos que tudo resulte em apenas uma perda de consciência e o soltar do garrote.
Ao contrário, o enforcamento tem sido desde há ...
Translated from
CZ
to
PT
by Stepanka Lichtblau
Written in CZ by Lucie Faulerová
Sempre vivemos nesta aldeia
Mudámos de pele. Digo-o a mim mesma em frente ao espelho de água que o tanque nos proporciona. Já não existem vacas na aldeia, pelo que este bebedouro é nosso, como quase tudo o que nos rodeia. Nosso e de ninguém. Património das que resistem e residem. A minha filha, que tem restos de lama e folhas secas no cabelo, agarra-se ao meu corpo como um animalzinho. Há muito tempo que não usamos o carrinho de bebé porque os caminhos de pedra estragam-no e os meus músculos habituaram-se a ela, ao seu peso e aos seus contornos, adquirindo contornos novos, atléticos, impensáveis. Já não sou uma mulher ma...
Translated from
ES
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PT
by Miguel Martins
Written in ES by Aixa De la Cruz Regúlez
Elogio do Furacão
Apreciei sempre a violência do quotidiano: por exemplo, a de um copo que se parte na escuridão. Às vezes, pergunto-me se essa memória é realmente minha. Revivo a cena com uma alegria difícil de conter: o objeto que cai e se desintegra e se torna estrépito surdo e logo tumulto de vozes a meio da noite. A minha mãe carrega no interruptor para iluminar os vidros espalhados. A sua mão aberta no ar, por cima de mim. O som da bofetada que não se parece, de modo algum, com o som do vidro contra o chão e a sensação de compreender que tudo faz parte da cerimónia. A violência que principia com um copo e...
Translated from
ES
to
PT
by Miguel Martins
Written in ES by Alejandro Morellón Mariano
Mudar de ideias
A Maixa recomenda-me que pronuncie todas as sílabas, sem me armar em londrina, que não me alongue muito no enquadramento teórico, que experimente o equipamento informático antes de começar a defesa, que seja humilde, que tome nota das perguntas e sugestões do júri e que os convide para almoçar num restaurante de menu fixo. A June opina que isso do menu é muito foleiro e sugere-me um refeitório na faculdade, uma citação de Weber, meio Lexatin ao pequeno-almoço e dar-me boleia até Gasteiz. Aceito a bibliografia e o transporte.
Saímos de Bilbau com a minha mãe, a minha prima e o meu namorado co...
Translated from
ES
to
PT
by Miguel Martins
Written in ES by Aixa De la Cruz Regúlez
Um carro da Grécia antiga
Era um dia quente de junho. Só que não se dizia junho, mas antes Thargelion ou Skirophorion. As duas figuras saíram das muralhas de Atenas e, em amena conversa, dirigiram-se, ao longo do rio Ilissus para o campo. Falavam sobretudo de amor.
O mais novo dos dois, o jovem, levava consigo uma transcrição do discurso de outra pessoa sobre o amor ser o mal, e ele até acreditava nisso. Na verdade, ele falava apenas desse discurso de outra pessoa. O homem mais velho discordou com ele mentalmente, mas deixou-se levar pela paixão do jovem. E assim pararam debaixo de um grande plátano onde o mais velh...
Translated from
CZ
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PT
by Stepanka Lichtblau
Written in CZ by Ondrej Macl
O retrato
A casa tinha uma porta de carvalho e uma fachada imponente. Não havia nomes na campainha. David demorou um pouco a descer e eu fui olhando a rua à minha volta. Era calma e branca, não se comparava com o bairro ao pé do canal onde a Sam e eu morávamos. Eu oscilava entre o devaneio e a irritação, como me acontecia muitas vezes quando era confrontada com coisas que não me podia permitir.
Ele abriu a porta e sorriu-me. Tinha a camisa aberta. Eu subi as escadas atrás dele e fui novamente envolvida pelo cheiro dele: nozes e terebintina. O atelier estava tão desarrumado como da outra vez, mas havia...
Translated from
NL
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PT
by Lut Caenen
Written in NL by Hannah Roels
Eu não era, mas agora sou. Sensível a qualquer mudança do tempo.
Lá do outro lado do canal levávamos na cara com o vento carregado de flocos de neve, mas depois de atravessar a ponte, já nesta margem, fica-se de costas ao vento, o que torna o processo todo um pouco mais agradável. Desta nova posição a paisagem pode ser contemplada com menos esforço, sem fechar os olhos. O canal ainda não está completamente congelado mas não tarda e o gelo fecha e cobre tudo, é questão de poucos dias. Não há nada a fazer. À primeira parecia ser uma miragem, mas logo se confirmou que havia lá, no meio do canal, um cisne a tentar passar abrindo sempre um caminho na superfície ...
Translated from
SR
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PT
by Ilija Stevanovski
Written in SR by Marija Pavlović
Sónia levanta a mão
Por estes lados, as pessoas são muito desconfiadas. Mas não se sabe se noutros sítios a iriam receber de braços abertos. As pessoas do lado dele. Os do outro grupo. Não conhece, no círculo dela, casais das gerações anteriores, em que os dois sejam amigos, e não inimigos, mesmo que fiquem juntos até à velhice. Algures no mundo talvez existam os que ainda ficam amigos a vida toda e para além dela, mas são poucos, extremamente sortudos e bem escondidos aos olhos dos outros, de tal forma, que, olhando à tua volta, tu, jovem, possas estar quase convencido de que quem está ao teu lado chegará a dest...
Translated from
RO
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PT
by Cristina Visan
Written in RO by Lavinia Braniște
A ranhura do zangão
O dia zero
Os seus dedos deslizaram quase automaticamente até ao telemóvel, que pousou ao pé do prato da sopa. Não que esperasse que no ecrã aparecesse algo excitante, mas os velhos hábitos são difíceis de esquecer... De cada vez que veio passar alguns dias a casa, preferiu desativar a aplicação web de encontros. E ainda não saberia dizer se o fez por si se pela sua família – dado que se sentia desconfortável em deixá-los embaraçados –, ou se o fez para se proteger do desconforto de segunda mão: não suportaria que por entre os perfis avistasse as nicks deploráveis e as lamentáveis e meio dis...
Translated from
SL
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PT
by Barbara Jursic
Written in SL by Agata Tomažič
Linguado
Flutuo com a cara dentro da água, sem me mexer. Não chamar a atenção, não gastar energia. Simplesmente boiar. Expirar lentamente, muito lentamente. Pequenas bolhas que me fazem cócegas nas faces quando sobem.
No último momento o meu corpo vai estremecer, a barriga vai encolher-se para forçar a boca a abrir-se e, nesse momento, vou levantar resoluta e calmamente a cabeça para fora da água e engolir uma grande golfada de ar.
Ninguém dirá «72 segundos!»
É um talento que não nos leva a lado nenhum na vida. Quando muito, mais perto de nós próprios.
Estou sentada no fundo da piscina e olho para ...
Translated from
NL
to
PT
by Lut Caenen
Written in NL by Nikki Dekker
Uma vida a meio
Casablanca, 1954
Ela filtra o ruído das crianças a brincar lá fora e todos os dias guarda alguns sons aos quais se agarra obstinadamente. Colhe os poucos sons que penetram através das paredes. Passados alguns meses já conhece os vizinhos todos, embora nunca saia do quarto. Sabe que estão sempre a aparecer credores em casa dos vizinhos do lado, mas não adianta porque o homem não quer pagar. «Nem que me arranquem primeiro os órgãos do corpo e me matem depois» é o que o ouve dizer à mulher depois de os credores saírem. Quando ouve estas coisas tem a sensação de ser um elo na história e nos segre...
Translated from
NL
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PT
by Lut Caenen
Written in NL by Aya Sabi
Sobre os corcéis e os demónios
Recordo o dia de ontem como se fosse ontem. Em Bruxelas, apanhei um comboio – aliás, dois, porque tive de mudar para a correspondência – para Haia só para ver uma única pintura.
O demónio obcecou-me com um desejo obsessivo, pelo que simplesmente tive de ir.
Mas a viagem estava longe de ser o que eu imaginava, o que confirmei quase imediatamente depois de sair do hotel, então deixei tudo e todos para trás.
Na estação de comboios de Bruxelas, Gare du Nord, quase embarquei num comboio errado porque sincronizei-me com o horário da Gare Central, de modo que, em vez de comprar o bilhet...
Translated from
SL
to
PT
by Barbara Jursic
Written in SL by Mirt Komel
O reencontro
Já chega. Arrumei as malas, o fato na capa, a calçadeira de sapatos e entreguei a chave. Até casa tenho de conduzir durante seis horas, mas o caminho de regresso é mais curto. Abri a janela e, com a cabeça de fora, atravesso cada vez mais rápido a avenida principal da cidade. No fresco da noite e da velocidade, o ar corta-me a face e isso recorda-me a aspereza da esponja desmaquilhante. Tenho uma tez sensível e não suporto com facilidade o tratamento que os apresentadores do noticiário têm de fazer para não se parecerem com uma lua cheia de brilho – é-lhes aplicada uma camada de base em pó, qu...
Translated from
RO
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PT
by Cristina Visan
Written in RO by Alexandru Potcoavă
Estação de tratamento
Vagueava defronte de um aglomerado de dormitórios do estaleiro, esfregando as suas mãos frias. Ao longe, dois corvos-marinhos cintilavam por cima do rio. Pouco depois, ela começou a olhar em todas as direções e a verificar a mensagem de texto que chegara ontem. “Olá Petra, ação ETAR amanhã às oito. Encontro frente à ponte junto do aglomerado. A.” Ela leu-o mais três vezes antes de a luz do visor se apagar.
A antiga e a nova estação de tratamento que partilhavam os resíduos vindos de toda a cidade ficavam uma atrás da outra na ilha, tal como governadores do rio. Enquanto a mais antiga se ergui...
Translated from
CZ
to
PT
by Stepanka Lichtblau
Written in CZ by Anna Háblová
Coisas que nunca mudam
E eu ainda era vazio de medo por ti, por isso punha a mão para cima, pedindo descendência da tua. E a tua mão lá descia, música de elevador, quente como paninhos, tinha veias como as esquinas das cobras que estão sempre caladas, roías as unhas até encolherem como conchas, e a tua mão lá descia descendência para se dar à minha e entrelaçávamo-nos por meio dessas minhocas que são os dedos.
Coitado de ti. Antes disso, andaste comigo ao colo, gemias músicas de embalar a meio da noite quando também precisavas de ressonar. Limpaste-me o rabiosque várias vezes, tocaste com as minhocas nos meus cocós...
Written in PT by Luis Brito