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Welcome to our publication platform! You can browse and search for stories and samples from all our writers. Thanks to our translators, each story is available in Czech, Dutch, Italian, Polish, Portuguese, Romanian, Serbian, Slovene and Spanish. Throughout the years, this platform is becoming a growing archive of European literature by the future generation of literary artists. We're sharing stories beyond barriers.
O Dilema do Guarda-Chuva Castanho Primeira Porta à Direita Nada
Certo dia, na realidade, foi encontrado um guarda-chuva castanho. Era um guarda-chuva grande, com um cabo de madeira, sob o qual cabiam duas pessoas. Residia numa gelataria, num canto empoeirado. Nela habitavam igualmente algumas aranhas de enormes patas. Certa noite… – era uma noite de verão – , o chapéu-de-chuva abriu os olhos e decidiu: «Vou-me embora.» Mas não tinha pernas e por isso não podia andar sozinho para nenhum lado. Alguém teria de o levar.
Como habitualmente, no dia seguinte de manhã, Carl abriu a loja e sentou-se atrás do balcão, à espera dos clientes. Tinha de ser um dia...
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RO
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PT
by Simion Doru Cristea
Written in RO by Anna Kalimar
Outra Cidade
Outra cidade
Amesterdão no limiar do outono era colorida e caprichosa. O sol alternava-se com a chuva, e isso repetia-se uma e outra vez tal como Ave-Marias num rosário. Encontrava-me debaixo da ponte, esperando até que um dos breves aguaceiros parasse. Tinha planeado uma viagem de bicicleta pelos arredores de Amesterdão. Quis ver aqueles famosos pólderes - canais de água que cruzam os prados verdejantes dominados por moinhos de vento que esticam os seus braços, feito uns espantalhos no campo. Era suposto ser a minha primeira viagem na nova cidade. A primeira experiência que de alguma forma i...
Translated from
CZ
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PT
by Stepanka Lichtblau
Written in CZ by Anna Háblová
Apesar da primavera
Sob a luz intensa duma lâmpada de néon da fraca qualidade, Mariana Gruić cuspia tentando limpar a lama das suas coxas. Ainda era jovem e ainda capaz de correr numa flecha até à entrada, nem sequer tinha que andar pelo caminho pavimentado, as sapatilhas gastas que tem dão-se bem com a terra e a poeira. Mariana refletia sobre a vida, ainda ontem pulava elástico, e já hoje o namorado beijou-a de língua e ela sentiu uma língua alheia, quente e áspera, a encher-lhe a boca. A vida vai mudando, dizia a avó de Mariana, a vida vai mudando sem parar, só que vai ficando sempre pior. Mariana Gruić a...
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SR
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PT
by Ilija Stevanovski
Written in SR by Ana Marija Grbic
Francamente querida, tanto me faz
O Marek faz-me cair na cama e pelo seu rosto passa-se algo que combinado com o seu aperto, me faz perder completamente a orientação, como se a nossa cama fosse uma avalanche em que ele me afundou e eu esquecia onde é em cima e onde é em baixo. Tudo isto dura apenas um segundo, esse aperto e essa sua expressão, no momento seguinte saca-me da avalanche, e ainda que eu permaneça na posição horizontal, já me é perfeitamente claro onde é em cima e onde é em baixo. E só agora atinjo, mas mesmo assim apenas em contornos, agora me apercebo dessa ideia, que dispara pela minha cabeça como se alguém acen...
Translated from
CZ
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PT
by Stepanka Lichtblau
Written in CZ by Lucie Faulerová
Calcário
Ora, está visto que leva muito tempo para uma cabeça de chuveiro ficar entupida com calcário. Agora que me balanço aqui, com o tubo do chuveiro enrolado à volta do pescoço, meio pendurado no corredor, meio pendurado por cima das escadas, penso: se todos os meus amigos tivessem visto a casa de banho, tinham percebido logo. Se todos tivessem subido uma única vez ao andar de cima, como fez a Ema naquela tarde, teriam olhado para a cabeça de chuveiro, teriam aberto e fechado a torneira, teriam visto a divisória de vidro calcificada do duche, teriam reparado nos pelos da barba feita à pressa no lav...
Translated from
NL
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PT
by Lut Caenen
Written in NL by Lisa Weeda
Sempre vivemos nesta aldeia
Mudámos de pele. Digo-o a mim mesma em frente ao espelho de água que o tanque nos proporciona. Já não existem vacas na aldeia, pelo que este bebedouro é nosso, como quase tudo o que nos rodeia. Nosso e de ninguém. Património das que resistem e residem. A minha filha, que tem restos de lama e folhas secas no cabelo, agarra-se ao meu corpo como um animalzinho. Há muito tempo que não usamos o carrinho de bebé porque os caminhos de pedra estragam-no e os meus músculos habituaram-se a ela, ao seu peso e aos seus contornos, adquirindo contornos novos, atléticos, impensáveis. Já não sou uma mulher ma...
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ES
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PT
by Miguel Martins
Written in ES by Aixa De la Cruz Regúlez
Comunhão
— Será aqui?
— No papel está esta morada, não te diz alguma coisa?
— Eu lembro-me disto como um descampado. Teria sido mais fácil com o nome do restaurante.
— Deu-to quando te ligou.
— Tem de ser aqui. Há muitos carros — respondi, pondo o sinal intermitente, decidido a estacionar.
— Telefona à tua irmã e tiramos as dúvidas.
— Não o guardei porque pensava que não vínhamos. Nem sequer conheço a criança.
— Tiveram a gentileza de nos convidar. Pode ser uma boa altura para tu… Já sabes…
— Já sei. Já sei — interrompi-a, sem vontade de mais reprimendas. — Que horas são?
Luz tirou o conju...
Translated from
ES
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PT
by Matias Gomes
Written in ES by Roberto Osa
O regresso
As coisas descarrilaram em agosto, num domingo de manhã, quando os primeiros transeuntes da Place du Parvis Notre-Dame, empregados dos cafés da zona, viram o objeto, algo como uma bala gigantesca assente no solo com a ponta virada em direção à catedral e a parte traseira na direção da esquadra de polícia. Numa primeira estimativa, o projétil media por volta de vinte metros de comprimento e cinco de diâmetro. Os empregados de mesa e de bar aproximaram-se com curiosidade, deram uma volta, encolheram os ombros e foram abrir os restaurantes. Isto foi por volta das sete.
Por volta das oito, os pad...
Translated from
RO
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PT
by Cristina Visan
Written in RO by Alexandru Potcoavă
Não quero ser um cão
Escrevo no teclado: «PÔR FIM A UM DESGOSTO DE AMOR». Vejo histórias de pessoas mas não quero histórias. Quero soluções, não quero compaixão. Isto tem de parar agora. «TRANSFORMAÇÃO», escrevo. O Google diz que há transformação na matemática e na genética. Opto pela segunda e com isto faço a minha primeira escolha. Estou farta deste corpo que já foi beijado por demasiadas pessoas, que talvez até esteja estragado. Tenho sido muito imprudente com ele, demasiado descomprometida, tem de acabar, tem de ser outro e melhor. Transformação genética. «Cura com sumos» aparece no ecrã. «Transforma-te numa v...
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NL
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PT
by Lut Caenen
Written in NL by Alma Mathijsen
A Tapioca
Foi o ronco do motor da carrinha da associação que anunciou que era hora de almoço naquele dia em que o sol de tanto queimar não se via. O velho estava debaixo da figueira, envergando uma camisa muito suja toda desabotoada, com um riso irónico na boca fechada para segurar o cigarro. Ficou a ver a brasileira - duas grandes manchas de água debaixo dos braços e as costas da farda igualmente ensopadas - sair do veículo; ir buscar as marmitas e dirigir-se para o anexo que funcionava como cozinha onde era hábito ele estar.
— Tio João! Tio João!
O riso a contrair todas as rugas do rosto, abrindo re...
Written in PT by Daniela Costa
Notas sobre a vida de Frances Donnel
Prólogo
Em 1945, Frances Donnell, escritora e conhecida criadora de aves, nasceu nos Estados Unidos. Em 1983, fingiu morrer de lúpus, doença que a afligia desde a sua juventude. Meses depois da sua tentativa, descobriu-se que tinha sido tudo um boato. Após uma pequena polémica, a que chegaremos no momento oportuno, Frances permaneceu no anonimato durante várias décadas. Já no século XXI, chegou a Espanha com a dureza da doença às costas, pois aquela não tinha deixado de crescer dentro de si. Costumava dizer que tinha abandonado o seu país no momento em que se tornara demasiado velha para sent...
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ES
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PT
by Miguel Martins
Written in ES by Adriana Murad Konings
Uma vida a meio
Casablanca, 1954
Ela filtra o ruído das crianças a brincar lá fora e todos os dias guarda alguns sons aos quais se agarra obstinadamente. Colhe os poucos sons que penetram através das paredes. Passados alguns meses já conhece os vizinhos todos, embora nunca saia do quarto. Sabe que estão sempre a aparecer credores em casa dos vizinhos do lado, mas não adianta porque o homem não quer pagar. «Nem que me arranquem primeiro os órgãos do corpo e me matem depois» é o que o ouve dizer à mulher depois de os credores saírem. Quando ouve estas coisas tem a sensação de ser um elo na história e nos segre...
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PT
by Lut Caenen
Written in NL by Aya Sabi
Os Seres Vivos
Capítulo 1
A mamã morreu sozinha e devagar. A causa da morte, dizem os médicos, foi uma intoxicação. A mamã intoxicada. Grande estupidez. Não discuti com os médicos, limitei-me a assinar os papéis e a tratar do enterro. Se havia algo que a minha mãe conhecia bem era a sua farmácia. Sempre foi exata com as doses. Não se enganava. À menina, por enquanto, contamos-lhe a versão oficial, a da intoxicação. Um dia contar-lhe-ei eu mesma que a avó dela se suicidou.
A menina esteve presente em todos os momentos, depois de lhe dar a notícia levámo-la ao tanatório. Esteve colada às minhas perna...
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ES
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PT
by Matias Gomes
Written in ES by Mariana Torres
Diário de uma Portuguesa em Angola
Prólogo
Durante anos a fio fui bombardeada com histórias acerca de Angola. Histórias extremistas de quem se apaixona ao primeiro segundo e se sente em casa neste país, ou de quem odeia e não se consegue adaptar. Histórias mirabolantes daquelas que parecem ser de ficção, porque há uma parte de nós que não acredita que possam ser verdade. Pensei sempre que exageravam bastante e, tal como o provérbio popular indicado para esta situação é de que quem conta um conto acrescenta um ponto, neste caso, acrescentavam vários.
Durante anos andei indecisa sobre conhecer ou não este país tão místico. Hav...
Written in PT by Patrícia Patriarca
Todas as pessoas se tornam irmãos
Quando vi o Andrei afastar-se, comecei a gostar dele. Vi a sua mochila preta a abarrotar que ele transportava como um escudo sobre as costas. A mochila estava tão cheia que se percebia logo que ele não estava a caminho de nada, que não ia a lado nenhum. Se tivesse ido para as montanhas assim, a mochila ia desequilibrá-lo, podia puxá-lo para trás, e lançá-lo no abismo. Os fechos éclair da mochila estavam velhos e parecia que iam rebentar a qualquer momento. Eu imaginava que a mochila ia abrir-se de repente, como um airbag, uma almofada de ar que começava a crescer, cada vez maior, e que se tran...
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NL
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PT
by Lut Caenen
Written in NL by Yelena Schmitz
Sinopse
A história que comecei a escrever tanto poderá tornar-se parte de uma antologia de contos breves – centrados em diferentes personagens ligadas entre si – como um fragmento de um romance young adult.
Estamos no futuro próximo e, dentro de um chat de pais apreensivos, sucedem-se alarmismos e escândalos, fluindo em catadupa numa comunidade restrita, aparentemente atenta e justa, embora na verdade lívida de invejas e individualismos. Emerge com força – ao desenrolarem-se disputas, mentiras, poses e afirmações de pequenos poderes mesquinhos – a total incompreensão da vida emocional dos filhos por ...
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IT
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PT
by Vasco Gato
Written in IT by Arianna Giorgia Bonazzi
Alguns minutos à deriva
O dia começou mais cedo do que tinha pensado.
Tinha posto o alarme para tocar às 5.56 por várias razões. Queria ter tempo para a meditação matinal e também, para poder aguardar trinta minutos que o comprimido que melhora as funções da tiroide fizesse efeito antes do café, e depois, começar uma série de exercícios que combinam o queimar das gorduras com a tonificação dos músculos, usando somente o próprio peso, sem esquecer, entretanto, de ligar o esquentador elétrico, porque o aquecimento da água leva umas quatro horas, o que me dá tempo de sobra para acabar também a sequência de ioga para ab...
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RO
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PT
by Cristina Visan
Written in RO by Cristina Vremes
A Aguardente que mata
DE LIVRO DE CONTOS: A AGUARDENTE QUE MATA
DISCLAIMER: Os seguintes excertos são de um livro de contos composto por seis ciclos (Uma notícia incomum, As aves não sobrevoam os subúrbios, Os esboços do minibus, A aguardente que mata, Pela boca, Fizeram bem em bombardear-nos). Cada um dos ciclos contém cinco contos. Os contos condensam os protagonistas e os acontecimentos, e entrelaçam-se entre si no espaço.
CICLO AS AVES NÃO SOBREVOAM OS SUBÚRBIOS
As Casas da cultura nas terras pequenas foram todas convertidas em lojas. Em frente delas há sempre três ou quatro homens de chinelos abibas d...
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SR
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PT
by Ilija Stevanovski
Written in SR by Ana Marija Grbic
O arrendamento
Os meus dedos grossos de trabalho e velhice arranham-me as maçãs do rosto de cada vez que enxugo estas lágrimas que não me deixam. Estou convencida que o mar não tem fim e não sei de onde me nasce sempre mais uma aflição se já estou morta dentro de mim. Não haverá paz depois do fim de tudo?
Nunca vi o mar, mas sei como se fazem os caminhos. À água ninguém lhe põe a mão, que ela vai sempre onde quer ir, mas eu sei arregueirá-la e tirar partido da sua teimosia, antes que me volte a fugir e vá lá para os confins encher os espaços do meu desconhecimento. Não medi ainda o tamanho do espanto de con...
Written in PT by Daniela Costa
E lá longe Dedos Dez
POLEGAR
Mesmo estando no décimo segundo andar, consegues ouvir o barulho das obras. Estás a lavar a louça. Rebolaste para fora da cama, vestiste uns boxers e, de tronco nu e sem meias, começaste a lavar a louça. Como não saiu logo água quente da torneira, esqueceste-te de abrir a torneira da água fria, pelo que a água ficou demasiado quente, magoando-te as mãos. Quando as tiras
debaixo de água, ficam vermelho-vivas.
A banca está toda coberta de louça suja. Também no chão da cozinha estão panelas, travessas de vidro e pilhas de pratinhos com requeijão ressequido nas bordas. O chão da ...
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NL
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PT
by Xénon Cruz
Written in NL by Joost Oomen